Brasil gastará recorde de US$ 900 milhões em eleições locais enquanto políticos atacam orçamento
- Politiza MT
- 17 de jul. de 2024
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Os montantes atribuídos às atividades de campanha aumentam apesar da pressão para controlar os gastos nacionais
O Brasil está se preparando para realizar as eleições locais mais caras de sua história, enquanto partidos políticos e líderes do Congresso cortam fatias cada vez maiores do orçamento público, criando uma crise de governabilidade para o presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Políticos entregaram a si mesmos R$ 4,9 bilhões (US$ 900 milhões) em fundos públicos para pagar por atividades de campanha antes das eleições municipais em outubro. Os custos logísticos de realização da votação são financiados separadamente pelo tribunal eleitoral. A verba é mais que o dobro dos R$ 2 bilhões destinados à campanha para as eleições locais em 2020 e equivale ao total gasto nas eleições presidenciais, para governador e para a assembleia estadual combinadas em 2022. Os R$ 4,9 bilhões superam o orçamento anual de R$ 3,7 bilhões do Ministério do Meio Ambiente do Brasil, que, entre outras coisas, é responsável por coibir o desmatamento ilegal, a mineração de ouro e a grilagem de terras na floresta amazônica. Isso acontece em um momento em que o governo brasileiro está sob intensa pressão para cortar custos em meio às crescentes preocupações do mercado sobre a trajetória fiscal do país. O orçamento crescente para financiar atividades de campanha nos 5.500 municípios do Brasil se tornou outro exemplo de parlamentares e políticos reivindicando grandes somas do erário público, o que críticos e analistas dizem ter empoderado o parlamento às custas da presidência. Também há preocupações sobre transparência e como os fundos são usados. “O equilíbrio de poder mudou em favor do Congresso”, disse Bruno Carazza, professor da Fundação Dom Cabral. “Os congressistas hoje em dia dependem menos do presidente para fornecer [financiamento] pork barrel para seus eleitores locais.” Os legisladores defenderam a alocação como parte do processo democrático. Zeca Dirceu, do Partido dos Trabalhadores de esquerda de Lula, disse no ano passado: “Os recursos do fundo eleitoral são essenciais no exercício da democracia. Estamos falando de 0,2 por cento da receita do país. Então é razoável. E as eleições municipais são muito caras e importantes para a democracia.”
Luiz Inácio Lula da Silva fala durante reunião ministerial em Brasília. A influência dos legisladores brasileiros aumentou na última década © Ton Molina/Bloomberg
Outro exemplo da crescente influência dos parlamentares é seu controle do orçamento público por meio da alocação de subsídios discricionários que são usados para investir em seus eleitores. No passado, a alocação desses fundos ficava amplamente a critério do executivo. Os legisladores, no entanto, aproveitaram vários momentos de fraqueza do governo na última década para se darem o poder de alocar fundos. Hoje, os legisladores têm o direito de adicionar subsídios no valor de milhões de dólares ao orçamento federal — e o pagamento é obrigatório. Sob o governo Lula , esses pagamentos somam cerca de 22 por cento do orçamento discricionário do governo ou cerca de US$ 8 bilhões anualmente, de acordo com dados da consultoria Prospectiva. Sob a administração anterior de Jair Bolsonaro, os estipêndios valiam cerca de 33 por cento do orçamento discricionário. “O controle do Congresso sobre os gastos orçamentários aumentou muito [na última década]. Isso lhe dá autonomia”, disse Marina Pontes, analista política da Prospectiva. “Os estipêndios são constitucionalmente previstos. O problema não é o mecanismo, mas a dimensão que ele assumiu.” Lula demonstrou exasperação com a situação, que reduz a capacidade do presidente de esquerda de negociar com o Congresso brasileiro, dominado pela direita. “A verdade nua e crua é que . . . O Congresso se tornou muito poderoso”, disse o presidente em uma entrevista de rádio no mês passado. “O executivo se tornou enfraquecido na arte de exercer o orçamento. Isso é concreto e o mundo inteiro sabe disso.” As eleições locais estão programadas para ocorrer em dois turnos em outubro e elegerão prefeitos e vereadores. As pesquisas são tipicamente vistas como um termômetro da popularidade do presidente. Mas elas também são um meio importante para os partidos políticos fortalecerem sua presença local e sua máquina eleitoral antes das eleições nacionais em 2026. Carazza ressalta que as eleições locais deste ano custarão aos cofres públicos o mesmo que as eleições nacionais de 2022, embora “sejam realizadas em territórios pequenos, o que exige menos gastos com logística e marketing”. O Brasil criou seu fundo eleitoral público em 2017, depois que o Supremo Tribunal Federal proibiu doações corporativas após o escândalo de corrupção de longa data da “Lava Jato”. Os fundos são alocados principalmente para partidos políticos com base no desempenho na eleição nacional anterior e no número de assentos que eles ocupam no Congresso. O dinheiro deve ser usado exclusivamente em atividade eleitoral, mas casos de uso indevido são comuns e sanções são raras. Uma tática comum é lançar candidatos falsos, que não disputam as eleições de forma competitiva, mas, em vez disso, canalizam o dinheiro que recebem de volta para o orquestrador do esquema. O fundo cresceu de R$ 1,7 bilhão em 2018 para R$ 4,9 bilhões neste ano, com os aumentos concedidos pelos parlamentares durante as negociações orçamentárias anuais.
Reportagem adicional de Beatriz Langella
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